domingo, 30 de março de 2014

Remembrance


Eis que de Governador Valadares, no interior mineiro, em 1993 surge o pioneiro brasileiro do estilo "A Bela e a Fera", ou Gothic Metal com vocais guturais e femininos. E nenhuma banda nacional ainda conseguiu superar a obra do Silent Cry, principalmente este debut de 1999 chamado Remembrance. Tristeza pouca no som dos mineiros é bobagem, o negócio aqui é a melancolia mesmo. Não é a toa que na demo "Tears of Serenity" a banda já apresentava influências de Anathema daquela mesma fase. Me lembro até hoje de ter presenciado o Wilson Júnior da Demise Records comentando que o som do Silent Cry era lindo, só ouvindo pra saber como era. Ele estava vendendo seu peixe pois estava prestes a lançar este que seria o sétimo trabalho da gravadora, mas não estava mentindo de forma alguma. A começar pela arte da capa criada pelo inglês Sandy Gardner, com aquela mocinha indefesa sozinha em uma floresta escura.
A instrumental "Forgotten Dreams" abre o trabalho de forma brilhante, onde os teclados dão a tônica da canção que é muito agradável e é uma mostra do que está por vir, a bela "Tragic Memory", que nos dá a noção do belo trabalho do tecladista Bruno Selmer. Os vocais guturais do lider guitarrista Dilpho Castro estão um pouco baixos, mas nada que comprometa, é aquele gutural arrastado (assim como o som). Neste debut o som é doom mesmo, nada de canto lírico e orquestrado como bandas como Nightwish e Tristania fariam depois, a onda é a mesma do Theatre of Tragedy e a voz de Suelly Ribeiro é um caso à parte. O Silent Cry teve sorte e competência por ter uma voz tão bela em seus primeiros álbuns, o que foi em parte responsável pelo crescimento da banda. Ouçam a menina cantando em "Celestial Tears" que entenderão o que estou falando. Mas de preferência à noite em um quarto escuro tomando uma taça de vinho. "Ages" é menos densa, pois começa com as guitarras choradas de Dilpho e Cassio Brandi em primeiro plano. "My Last Pain" é a menor das faixas com vocais, com apenas 2:50. Depois vem "The Devil Invites To Dance", bem doom, dando uma "clareada" quando entra a parte acústica e a voz triste de Suelly. "Innocence" é uma das mais belas deste trabalho onde a garota até canta de uma forma um pouco diferente e os vocais guturais são acompanhados dos vocais limpos de Cassio Brandi, o que ficou bem legal, e já sugeria que o próximo trabalho teria menos vocais agressivos. "Remembrance" de quase oito minutos fecha o álbum com mais vocais limpos no início, e é a faixa menos pesada do play, bem viagem mesmo. Completam a formação o baixista Jaderson Vitorino e o baterista Ricardo Meirelles. Uma pena que justamente os dois integrantes que mais se destacaram nesta formação do Silent Cry não permaneceram por muito tempo. Suelly só gravaria mais um álbum com a banda por causa da distância (ela vivia em São Paulo), e Bruno Selmer que nesta época tinha apenas 17 anos gravaria mais um álbum e um EP e deixaria a banda em 2002, cometendo suicídio em 2004, aos 21 anos. Uma enorme perda para o metal nacional. O que torna a audição de Remembrance algo ainda mais melancólico.

domingo, 23 de março de 2014

The Darkest Throne

Após aparecer na épica coletânea "The Winds of a New Millenium" da gravadora Demise e lançar o full length "Celebrate Thy War", o Malefactor da Bahia finalmente encontrou seu estilo neste grande álbum "The Darkest Throne" de 2001, através da Demise. Com um black metal épico, recheado de melodias e corais, o álbum é um prato cheio para apreciadores de bandas que falam de guerras medievais, folk e tudo mais que o estilo pede. Um ponto que chama a atenção neste trabalho é uma pequena diferença entre as 4 primeiras faixas e as 4 últimas. Enquanto as últimas que são "Prelude To a Battle", "Behind The Mirror", "The Darkest Throne" e "A God That Doesn't Lie" são mais para aquele lado War Metal, com mais bumbos acelerados e com maior influência black metal escandinavo, as primeiras faixas são mais sombrias e trabalhadas, com os vocais limpos de Lord Vlad melhor encaixados e mais melancólicos.
 O que pode justificar estas diferenças é que a parte final foi gravada em abril de 2000 no Tribal Studio com um produtor e a primeira parte 6 meses depois no estúdio Som das Águas com outra produção e mixagem. Mas tudo bem, mesmo que eu prefira a primeira parte, a segunda tem a clássica faixa título que inclusive é tocada e festejada nos shows da banda até hoje, com um refrão simples e forte. "Necrolust in Thulsa Abbey" abre o álbum com uma cacetada, onde vocais rasgados e guturais são intercalados e os teclados numa camada constante de fundo. A parte em que a música muda para a entrada dos vocais limpos é de tirar o chapéu, daí pra frente ela é um hino de guerra onde o que podemos imaginar é um exército marchando em direção à batalha. "Into The Silence" já abre com os vocais limpos, que se transformam no refrão, daqueles que ficam grudados na cabeça. "Luciferian Times" é a melhor faixa do álbum e uma das melhores da banda até hoje. Ela é uma porrada das melhores até que pára tudo e entra uma flauta maravilhosa, dando um toque fantástico e enriquecedor ao trabalho dos baianos. E "Breaking The Castles" é daquelas faixas épicas pra ficar na história. Violões, flautas e teclados com vocais limpos na melhor escola "Suidakra", pra deixar bem claro onde o Malefactor queria chegar. Dizem que a Cogumelo acompanhou a pré produção do álbum e na última hora não assinou contrato com a banda que foi para a concorrente Demise. Provavelmente se arrependeu, porque hoje o Malefactor está entre as maiores bandas do Brasil em atividade, e muito se deve à repercussão que "The Darkest Throne" causou.

sábado, 8 de março de 2014

Jachol Ve Tehilá


O título do álbum é complicado de entender e de pronunciar. Mas gostar de Jachol Ve Tehilá não é nada difícil. Isso porque estamos diante do maior trabalho de black/dark metal do Brasil e um dos melhores da história. O Amen Corner formado em 1992 em Curitiba, após lançar um full lenght e alguns outros trabalhos, incluindo o EP "The Last Celebration" onde aparece a clássica e infame The Five Glories, conseguiu registrar em 1995 seu ápice, uma obra prima inegável, novamente através da Cogumelo Records. Após uma longa introdução no teclado a melancólica "Seventy Seven Guardians", que depois de um dedilhado com a batera acompanhando começa com guitarras pesadas e melódicas e o vocal forte de Paulista, agora Sucoth Benoth, cantando, diga-se de passagem, muito melhor que em "Fall, Ascension, Domination", o álbum de estréia. Mas a música ganha agressividade e é um dos maiores clássicos da banda. "Lamentation And Prize" vem em seguida, com os mesmos andamentos arrastados, que aceleram um pouco aqui e ali, mas nada super extremo, a melodia é o que manda, tendo um final bem melancólico. "Black Thorn" é para mim a melhor faixa deste trabalho, com algumas paradinhas e o vocal muito bem encaixado, no ritmo que o instrumental pede. Essa música tem um grande trabalho dos guitarristas Murmúrio e Flach, com solos fantásticos sobre uma base bem eficiente.


 "Babilon, Might And Glory" também está entre as melhores do "Amen Corner", com bases que lembram o Samael em seus melhores dias. "The Cult of The Pagan Gods" inicia com uma narração sobre cultos a deuses e punições aos homens, mergulha em um dedilhado soturno a la Katatonia e entra um riff mórbido com Benoth arrebentando novamente. "My Soul Burns In Hell", "Nitz Achon Ve Shlitá" (quase um doom), "A Vision of the Valley of the Querubins" e "Zigurates Baal" fecham o álbum, todas com maestria, cada uma com identidade própria, percebe-se que nenhuma faixa entrou para alongar o trabalho, todas muito bem executadas pelos paranaenses. Paulista provou que era um dos melhores vocalistas do black metal nacional, e a banda, composta ainda por Cléio no baixo e Paulo Costa na bateria, estava mais do que inspirada quando gravou Jachol Ve Tehilá. Se fosse o caso de dar uma nota aqui, esta seria com certeza um 10.