sábado, 30 de outubro de 2021

Entrevista com Overdose!!!

 


O mundo dá voltas e mais voltas e poeticamente falando, isto é incrível. Ter a oportunidade de conversar com alguém que há quase 30 anos já era seu ídolo, tocando numa banda que você ama desde a primeira audição de Século XX num split emprestado por amigos, é mais que sonho realizado, é um dos ápices nesta jornada gratificante que se tornou o Metal e Loucuras. Overdose faz parte da gênese do metal nacional, e sua importância para a prosperidade desta cena está cravada nos pilares da existência do Heavy Metal. São dinossauros vivos em um país de terceiro mundo que não valoriza esta arte imortal que é o metal e isso já é digno de muito respeito. Cláudio, guitarrista fenomenal e pessoa sensacional, com seu jeito mineirês de ser, desceu do palco de um festival no estacionamento do Mineirão em 1997, quando tocaram junto de Megadeth, Queensrÿche e Whitesnake, e foi abordado por dois moleques que pediram autógrafo num pedaço de papel de pouco mais de 3 centímetros, que ele concedeu com um sorriso no rosto. Um destes moleques era eu, que jamais imaginava que estaria aqui hoje trocando palavras com este músico fenomenal. Um pouco da história do Overdose segue para vosso deleite, criaturas noturnas. Aproveitem, pois o mundo continua dando voltas!

M&L – Há mais ou menos 1 ano conheci uma pessoa, tratando de serviços profissionais e, conversa vai e conversa vem, quando ele soube que tenho um espaço do Heavy Metal em casa, ele disse que tinha o prazer de fazer parte do início do metal em Minas. Pensei que ele estava “viajando” mas se tratava de Rubão, o baterista de uma das primeiras formações do Overdose. O que vocês lembram desta época?

Cláudio - Rubão é um grande cara e foi muito importante no começo do OverDose em 1983. Foi uma época muito divertida, pois foi o nascimento do OverDose. Tudo era novo e nós éramos a primeira banda de Heavy Metal de BH. Os shows eram muito legais, e aos poucos fomos polarizando todos os fãs de Metal. Ensaiávamos na sala de estar da casa do Rubão e vários amigos começaram a ir aos nossos ensaios. Época de ouro, na qual o OverDose começava a se definir enquanto banda e a criar nome no espaço musical da cidade.


M&L – Há muitas lendas envolvendo Sepultura e Overdose nos primórdios, como aquela que diz que vocês convidaram o Sepultura para o split de 1985 e que os caras arranhavam o lado do Século XX do vinil quando iam apresentar o álbum aos gringos. Mas nunca ouvimos o Overdose depreciando a banda dos Cavalera por estas coisas. Elas realmente não passam de lendas ou o Overdose não se ressente delas porque sabe que teve sua oportunidade e espaço no exterior?

Cláudio - Não sei exatamente quais são as lendas, ou o que elas possam trazer de verdade. Essa história dos caras do Sepultura falarem para os amigos arranharem o lado do OverDose foi uma das que mais ouvi, não sei se é verdade ou não. Ainda somos amigos do Paulo e do Andreas, mas não tem como negar que esperávamos ter tido mais apoio do Sepultura em determinados momentos, principalmente quando estávamos no mercado mundial.

M&L – Na virada dos anos 80 para 90 tínhamos bandas do Brasil gravando em Belo Horizonte e procurando um contrato de lançamento com a Cogumelo. Por que Overdose lançou o ...Conscience... pela Heavy Discos (Dorsal, Azul Limão e outros)?

Cláudio - Fizemos uma reunião com os caras do Sepultura e fechamos um acordo no qual iríamos


pressionar a Cogumelo para aceitar algumas exigências no contrato para os próximos discos. Depois de um tempo, sem nenhuma comunicação prévia, ficamos sabendo que o Sepultura tinha assinado com a Cogumelo e já ia lançar seu próximo disco. A Cogumelo acabou negando a nossa proposta e ficamos sem gravadora. Tivemos que gravar o Conscience com o nosso próprio dinheiro e depois fizemos um acordo com a Heavy Discos para distribuir o álbum.

M&L – You’re Really Big! veio com capa futurística e com Nuclear Winter como carro chefe. Muitos fãs aguardam este relançamento. Fale deste álbum.


Cláudio - O Big é um dos álbuns que mais gosto do OverDose! Considero esse álbum como um dos precursores do Prog Metal, pois em 1989 ainda nem existia nada que fosse classificado nesse estilo. As guitarras são muito trabalhadas, com um virtuosismo que não existia na época no Brasil, foi inspiração para muitos guitarristas por aqui. O disco contou com a participação especial do Fábio Ribeiro, tecladista que depois integrou o Angra e o Shaman, entre várias outras bandas. Realmente está sendo um dos relançamentos mais esperados e está previsto para o começo do ano que vem.

M&L – E Addicted To Reality apresentou, além de um logo novo, um som um pouco mais pesado que os dois full anteriores. A receptividade deste álbum foi fundamental para o que viria nos álbuns posteriores?


Cláudio - Pelo contrário, pois a receptividade não foi tão boa na época, hoje em dia mais pessoas gostam dele do que quando foi lançado. O Addicted é um disco de transição entre o Prog Metal do Big e o Thrash do Circus, e acho que ficou mais marcado por isso do que pela qualidade de suas músicas e da originalidade da mistura. Acho que foi muito injustiçado, pois nosso antigo público achou ele muito pesado e a galera do Thrash achou muito leve. Pessoalmente, gosto muito do Addicted, pois acho as músicas muito boas, indiferentemente do rótulo.

M&L – Chegamos em 1992, com um dos melhores registros que o metal nacional já teve, o Circus of Death. Essa mudança de um som mais melódico para a agressividade do Thrash foi natural ou o Overdose resolveu sair do lugar comum e tentar algo diferente?

Cláudio - As duas coisas, de uma certa forma. Tivemos que sair da nossa zona de conforto, pois já tínhamos um estilo próprio de compor e tocar. Mas eu, o Bozó e o André estávamos ouvindo mais bandas de Thrash do que qualquer outra, a pesar de que nunca fomos radicais em nada. Só o Fernando relutou um pouco para aceitar a Sweet Reality, pois achou muito pesada. A partir daí, comecei a compor músicas mais na onda das bandas que estávamos curtindo: Metallica, Anthrax, Forbidden, Exodus, Pantera...

M&L – E por que Circus of Death foi relançado com aquela capa horrível tempos depois? (político com nariz de palhaço) “risos”. Imposição do mercado americano ou a banda queria fugir da imagem de crítica religiosa que a capa original passava?

Cláudio - Por um lado, realmente sofremos muitas críticas pela capa original, como se fosse uma falta


de respeito com Jesus Cristo. Mas a crítica religiosa é somente uma das que pretendemos fazer na capa, acabou ficando uma coisa meio chata ser taxado de satanista! (risos). Mas, o que foi decisivo foi a tentativa de criar um estilo mais próximo do Progress e do Scars, que já haviam sido lançados no exterior. Queríamos que fosse uma foto ao invés de desenho, mas também não gostamos do resultado, por isso o relançamento voltou a ter a capa original.

M&L – Progress of Decadence traz uma sacada no título e na imagem da capa, podendo ser lido como Decadence of Progress. A crítica social foi muito além neste trabalho, que também é um dos mais pesados da carreira. Nele o Bozó começou a tocar percussão, incorporando um pouco de ritmo brasileiro ao som.


Cláudio - A crítica social acompanha o OverDose desde os seus primórdios, mas realmente ficou mais ácida e menos poética nesse álbum. A saída do Fernando contribuiu pra isso. Antes o Fernando era o meu parceiro nas letras, e o Fernando é um puta escritor, muito bom nas rimas e nas poesias. Já o Sergio, que passa a ser o meu parceiro com a saída do Fernando, é mais pro Punk e Hardcore de New York. As minhas letras sempre foram políticas, mais descritivas do que realmente poéticas, então perdemos esse lado poético e ganhamos em críticas sociais. A percussão do Bozó surgiu das brincadeiras que o Bozó fazia nos ensaios desde os anos 80. Ele costumava fazer percussões brasileiras no surdo da bateria. Daí surgiu a ideia de acrescentarmos elementos percussivos no som da banda, queríamos fazer algo que fosse realmente novo dentro do Metal. Logo após o Circus, ainda em 92, já tocávamos Street Law nos shows. Como todos gostaram da ideia, outras músicas com percussão foram surgindo.

M&L – Em 1995 o Overdose lançou Scars por um selo gringo, e só em 2018 este álbum foi lançado no Brasil. Acha que isso fez com que o público tivesse um conhecimento menor deste play? Nele Bozó até criou um dialeto novo que ficou sensacional.

Cláudio - Acho sim, não só por não ter saído no Brasil, mas também porque não teve apoio da


gravadora na divulgação e investimento em geral. Quando o Scars foi lançado, a diretoria da nossa gravadora tinha acabado de ser trocada. O presidente que foi embora foi o A&R que contratou o OverDose, mas o novo presidente contratou o My Dying Bride. Nesse momento deixamos de ser a atenção da gravadora, pois todos os investimentos estavam voltados para a nova banda. O Scars é um disco que não foi trabalhado pela gravadora, considero o mais injustiçado do OverDose!

M&L – A banda encerrou atividades por volta de 1997 e ficou quase 20 anos fora de cena. Os fãs imploravam por um retorno e ele veio. Uma das primeiras apresentações foi aquela ao lado do Mineirão promovida pelo Bloco dos Camisas Pretas. Confesso que a única vez que chorei num show foi naquele dia ouvindo Anjos do Apocalipse, algo que pensei que nunca aconteceria de ouvir. O que significou pra vocês aquela apresentação?

Cláudio - Que doido o lance da Anjos, muito massa saber isso! O Bloco dos Camisas Pretas foi muito foda, mais de 20 mil pessoas, foi emocionante demais!!! A sensação de estar de novo no palco é muito foda, tinha muitos anos que eu não tocava! Foi muito massa ver a galera cantando as músicas do OverDose, principalmente a meninada! É muito gratificante ver que o som da banda sobrevive há décadas!

M&L – Tiago Vitek foi anunciado recentemente como novo baterista e já está ensaiando. Há planos de voltar aos palcos assim que vencermos esta pandemia?

Cláudio - Há sim, estamos ansiosos pra voltar aos palcos!!! E aproveitem, pois eu e o Bozó somos dois velhinhos de 55 com corpinho de 80!!! (risos) Daqui a pouco não vamos mais conseguir subir no palco, principalmente ele cantar! (risos).

M&L – A pergunta que não quer calar. Todos anseiam por um novo álbum do Overdose. Isso está nos planos?

Cláudio - Não temos planos de lançar um novo álbum, talvez um single com 2 músicas. Tenho duas músicas novas guardadas aqui, esperando o Sergio fazer letra pra elas. Também estou na torcida, vamos ver se a gente consegue engatilhar pelo menos essas 2 músicas novas!

M&L - O que vocês acham que vai mudar na cena metal e no mundo, em relação à pandemia que vivemos nos últimos dois anos?

Cláudio - Difícil prever quais serão as mudanças. Acho que uma maior interação entre os fãs e os músicos através das lives e redes sociais deve continuar. Ainda estou preocupado com o fim da pandemia, pois ainda há muita gente morrendo. Após a pandemia, a crise econômica me preocupa muito, pois a bomba sempre estoura para o lado dos mais fracos. Me preocupo muito com a miséria e a fome, que vêm aumentando muito nos últimos anos e cresceu muito com a pandemia. Em um mundo onde temos um incrível acúmulo de riquezas, a fome não pode ser aceita.

M&L – Uma honra ter o Overdose em nossa página, neste momento especial em que comemoramos 12 anos. O espaço é todo seu!

Cláudio - Eu gostaria de agradecer pela oportunidade, é um grande prazer participar dessa comemoração! Gostaria também de agradecer aos fãs de OverDose por quase 40 anos de reconhecimento e carinho. Continuamos na estrada por causa de vocês!!! Sigam o OverDose no Facebook e no Instagram e ouçam no Spotify, Deezer e outras plataformas. Se alguém se interessar pelos relançamentos do OverDose, pode me procurar no Facebook -"Claudio David", que tenho algumas cópias pra vender, ou procurar nas lojas especializadas. Os relançamentos são em digipack, com o CD completamente remasterizado, com DVD de shows de época e livreto com letras e fotos. Abraços para todos!!!

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